blogue

14/10/15

Longe do olhar, perto do coração

Culpa. Para quem cuida à distância, a culpabilização é frequente – “será que estou a fazer o necessário e o correto enquanto cuidador?”, “devo procurar ajuda especializada, como devo organizar-me?”. Não se deixe bloquear pelos medos, esteja atento aos sinais e atue por antecipação.

Por Carla Pacheco, Diretora Técnica da Good4Life.
 
Francisco é engenheiro civil, com uma carreira de sucesso a nível internacional. Ao recorrer ao apoio domiciliário, fala pela primeira vez do stress que sente fruto da situação clínica da mãe. Embora relativamente autónoma, foi-lhe diagnosticada doença de Parkinson há cerca de dois anos, o que lhe tem causado um aumento da debilidade física (tremores e dificuldades de locomoção). Francisco é filho único, vê a sua mãe fragilizada, ela que sempre cuidou de si com tanta dedicação, e sente-se angustiado. Ponderou bastante e decidiu procurar a ajuda de cuidadores profissionais.
 
A Dra. Belina Nunes, no livro Alzheimer em 50 Questões Essenciais, refere que de entre os desafios que o envelhecimento traz às sociedades humanas, a necessidade de solidariedade entre gerações é talvez o maior. Os avós são fundamentais na educação dos netos, aliviando as responsabilidades e o aumento dos momentos de lazer dos pais; e, por outro lado, a proximidade entre pais, filhos e netos é necessária para assegurar uma velhice tranquila. 
 
Francisco está longe e pôs em causa a sua decisão de emigração ao ver a mãe debilitada. Pensou levá-la para perto de si, “quem sabe pelo menos parte do ano?”… “Mas seria esta uma decisão egoísta?” Pois, tais mudanças dependem das circunstâncias de cada família. Francisco passará a ser um cuidador à distância, algo que, em Portugal, começa a ser frequente. Alguns dos maiores desafios encontrados por estes cuidadores espelham-se em sentimentos negativos, tais como:
 
Culpa. Para quem cuida à distância a culpabilização é frequente – “será que estou a fazer o necessário e o correto enquanto cuidador?”, “devo procurar ajuda especializada, como devo organizar-me?”. Não se deixe bloquear pelos medos, esteja atento aos sinais e atue por antecipação. Comece de forma simples através de fóruns online. São óptimos espaços para cuidadores se conectarem trocando ideias, conselhos e experiências. Passo a passo, elabore o seu plano de acção.
 
Incerteza. As tecnologias servem para colocar o cuidador em alerta. "O meu pai pareceu-me triste, será que está com algum problema? A minha mãe tem falado muito sobre uma amiga nova, será que é alguém de confiança?” Não sendo a solução milagrosa, o telemóvel pode ser um óptimo recurso para despistar problemas, assim como o Skype, se o idoso concordar com a sua utilização.
 
Impotência. “E se houver uma emergência, como agir?” Muitos cuidadores temem que o seu familiar caia ou adoeça repentinamente, receiam ser precisos e não estarem lá no imediato. Esta é uma angústia muito válida e sendo de todo impossível eliminar os infortúnios, há que prevenir. Para o idoso que vive sozinho, mas que é independente (não precisa de cuidados), um bom recurso é a teleassistência. No caso de queda ou mal-estar, o idoso poderá, com um simples accionar de botão, pedir ajuda e, se for preciso, de imediato será encaminhado para a assistência médica. Tem a vantagem de ser uma solução económica.
 
Simultaneamente, desenvolva uma rede social de suporte. Estabeleça relação com os vizinhos e amigos do seu familiar. Peça-lhes para partilharem uma refeição de vez em quando ou para realizarem uma visita de rotina. Mantenha-se em contacto. Se existir um grau de confiança muito elevado, faculte o acesso à habitação entregando-lhes a chave. Sempre, obviamente, com o consentimento do dono da casa!
 
Organize e fotocopie toda a documentação relevante, para quando for necessária. Inclua documentos legais, pessoais, médicos e financeiros, tais como: procurações, testamentos, registos de imóveis e viaturas, cartão de cidadão, carta de condução, entre outros. Guarde todos os números de contas bancárias, registos fiscais anteriores, cartões de crédito, fontes de rendimentos e ativos. 
 
No dossier clínico, devem constar: tipo sanguíneo, relatórios médicos, registos de internamentos anteriores, agenda de consultas, medicação atualizada e outros particulares do idoso. Toda a informação clínica deve estar identificada e acessível em caso de emergência.
 
Quando estiver presente, em caso de férias, ou por outros motivos, aproveite para avaliar o estado do seu familiar. Esteja atento aos sinais; verifique, por exemplo, como estão os reflexos ao nível da condução, pedindo que o leve a um determinado local. Procure agendar uma consulta no dentista, no oftalmologista, no médico de família ou noutro especialista enquanto estiver por perto. Sentir-se-á mais confortável ao acompanhá-lo.
 
Com estas ferramentas, estará no caminho para se tornar num cuidador à distância mais prevenido. Se a situação clínica se agravar, deverá procurar outras opções que remetam para cuidados de saúde especializados.

Submeter um novo comentário