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17/07/14

Envelhecer não é adoecer

Julio Fermoso, catedrático de Neurologia da Universidade de Salamanca
 
O processo de envelhecimento está associado a uma maior vulnerabilidade à doença, com tendência a tornar-se crónica, a várias patologias que se repetem e a um maior risco de situações de dependência e de perda de autonomia. Mas não existem “doenças próprias do envelhecimento”, embora seja evidente que certas patologias apresentam maiores taxas de prevalência nos idosos. Estas doenças são consideradas “dependentes da idade” porque a sua frequência aumenta bastante na faixa etária acima dos 65 anos. São os casos da hipertensão arterial, das demências, da dificuldade de mobilidade e transtornos de equilíbrio, da doença vascular cerebral, do Parkinson, da insuficiência cardíaca, da depressão, das cataratas e da incontinência. 
 
Uma caraterística geral do envelhecimento enquanto processo é a perda progressiva da capacidade de adaptação, com diminuição das reservas funcionais do organismo tornando-o mais frágil a qualquer agressão exterior ou interior e, por conseguinte, mais vulnerável à doença. Nunca se insistirá o suficiente no facto de que o envelhecimento não deve ser considerado como sinónimo de doença, apesar de ser de certo que é uma fase da vida com maior presença de processos patológicos que quebram o equilíbrio pré-existente quando os malefícios acabam por se sobrepor à capacidade de recuperação biológica. 
 
Ao analisar pessoas que passam pela fase de envelhecimento identificamos diferenças individuais relacionadas com fatores genéticos, estilos de vida, agressões do meio ambiente e com a diminuição da capacidade de resposta, pondo em evidência dois tipos de envelhecimento: o positivo (envelhecer com saúde) e o patológico em que o processo avança mais rápido (envelhecimento prematuro) com a perda evidente de funções e de capacidades.
 
Durante todo o processo de envelhecimento certas capacidades mantém-se em plena atividade, algumas mais desenvolvidas do que noutras fases da vida, ao passo que outras funções diminuem e podem até chegar a perder-se. De forma subtil e progressiva surgem mudanças que resultam do “esgotamento” progressivo das reservas funcionais de diferentes sistemas, tanto estruturais e hormonais como dos neurotransmissores, facilitando assim o aparecimento de doenças. Além disso, existe uma modificação principal que é geral e que consiste numa maior vulnerabilidade a agressões externas ou do próprio indivíduo, com pior capacidade de adaptação às situações de stress, biológicas ou psicológicas, endógenas ou ambientais.
 
Mais especificamente, e sempre no decorrer do processo normal de envelhecimento, surgem ocorrem alterações em todas as artérias do organismo (depósitos de cálcio, de colesterol e de outras substâncias na camada interna da parede, diminuição da elasticidade, estreitamento progressivo do calibre arterial ou microaneurismas nos vasos cerebrais) que em parte são responsáveis pela diminuição de funções no coração, no cérebro (menor coordenação e capacidade de reação motoras, menor sensibilidade a estímulos sensoriais na pele e nos órgãos com presbiopia, diminuição da capacidade auditiva, maior dificuldade de adaptação ao mudar de posição e com sensações de tontura, perda de memória recente e maior dificuldade na aprendizagem, para além das alterações no sono que se torna mais curto e fragmentado) e no sistema renal (diminuição da capacidade de concentrar e diluir a urina, alterações das funções nos glomérulos e nos túbulos com maior vulnerabilidade aos fármacos que apresentam mais efeitos adversos) 
 
Qualquer órgão sofre modificações na sua função com o simples decorrer do tempo ao longo do processo que abordamos e com um elevado nível de variabilidade individual sendo fisiológicas as perdas de funções citadas, mas não sendo as únicas.  
 
Ao longo do processo que abordamos, qualquer órgão sofre modificações na sua função que variam de pessoa para pessoa e, apesar de as perdas de funções citadas serem fisiológicas, estas não são as únicas. As consequências patológicas – doenças – estendem-se praticamente a todo o organismo podendo afetar o sistema cardiocirculatório (insuficiência cardíaca, patologia coronária, arritmias, hipertensão arterial, insuficiência vascular de extremidades), o sistema nervoso (demência, Parkinson ou Parkinsonimo causado por medicamentos, doença vascular cerebral, depressão), o sistema digestivo (refluxo gastroesofágico, cancro do cólon), o sistema respiratório (gripe, cancro do pulmão, bronquite crónica), os órgãos dos sentidos (catarata, glaucoma, surdez, vertigem), o sistema urinário (doenças da próstata, insuficiência renal), o sistema locomotor (artrite, osteoporose, fraturas) e o sistema endócrino (diabetes, obesidade, desidratação).

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