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08/12/14

Avós em tempos de crise

por Pilar Amaku, autora do blogue El Amaku

Hoje em dia, dado o momento crítico que a nossa economia atravessa com taxas de desemprego elevadas, são cada vez mais as famílias que sobrevivem graças à ajuda económica oferecida pelos avós. Idosos que não hesitam em colocar à disposição dos filhos e netos as suas pensões escassas e as poupanças conseguidas depois de muitos anos de privações e de uma “economia doméstica de guerra” em que muitas das nossas avós eram especialistas. Com poucos euros, muita imaginação e garra, conseguem levar o ditado “onde comem dois comem três” até ao verdadeiro limite, fazendo com que nunca falte um prato de guisado à mesa ou dois ou três... os que fizerem falta.

Há cada vez mais famílias a sobreviverem graças à ajuda económica oferecida pelos avós.

Muitos avós fazem malabarismos para que não falte o básico em casa.  São o conglomerado que permite a muitas famílias continuarem a ser isso mesmo: uma família, uma união de pessoas, um clã inquebrável.

Com a sua ajuda e um pouco de organização conseguem, como por exemplo Elpidia, a minha vizinha do terceiro andar, que sete pessoas vivam dignamente no seu apartamento de três quartos. Primeiro chegaram o seu filho e a sua nora, com dois filhos e um gato devido a um processo de despejo, mais um entre as centenas deles que acontecem todos os dias. E, há pouco tempo, juntaram-se a sua filha mais nova e o seu parceiro. Apesar de já serem independentes há alguns anos, os cortes no salário dela e o despedimento imediato dele há alguns meses fizeram com regressassem à casa da família “com mais de 30 anos, para dormirem num quarto cor-de-rosa, cheio de Nancys e com uma cama dos anos 90”. “Não há mal que não venha por bem” é algo que costuma repetir-se e até nisso os nossos avós são especialistas – em procurar ver o lado positivo das coisas, mesmo quando parece que ele já não existe. Elpidia está contente porque já não está tão sozinha, agora há sempre alguém em casa. O silêncio das tardes, que antes só era quebrado pelo som da telenovela, agora é preenchido com o riso das crianças. E até mesmo nas manhãs em que todos saem para procurar uma oportunidade, e ela fica sozinha com o fogão e o miar do gatos, sente-se útil como matriarca da família.

Com a sua ajuda e um pouco de organização, conseguem viver dignamente sete pessoas na sua casa... Elpidia está contente porque já não está tão sozinha...

Com a ajuda de alguns avós e muita determinação, consegue-se que muitas hipotecas sejam pagas de forma pontual, como é o caso de Arsenio, um homem que se senta a dar de comer aos pombos no parque onde costumo passear com o meu filho. Graças a ele e muitos como ele, o seu filho está a evitar uma ação de despejo... Não se envergonha de dizer alto e a bom som, que paga religiosamente sem ninguém lhe pedir. Sabe que não é fácil ter de pedir dinheiro a um pai a quem custa viver dignamente com a sua reforma e que mantém as poupanças conseguidas após muitos anos sem caprichos, guardadas para desfrutar da velhice com a sua esposa. Mas essas viagens com que sonhava podem esperar, prefere que os netos continuem a ter um teto e que o seu filho possa gastar as energias a começar o seu negócio, sem sofrer um esgotamento psicológico e sem conseguir dormir pela certeza de não conseguir fazer frente às despesas bancárias.

Com a ajuda de Arsénio, o seu filho está a evitar uma ação de despejo... As viagens com que sonhava podem esperar, prefere que os seus netos continuem a ter um teto...

Estes e muitos outros avós orgulhosos, pacientes e optimistas não se resignam, não se rendem e nem baixam a cabeça. Perante a crise, a sua atitude e a sua ajuda representam um ponto de viragem...

São homens e mulheres que priorizam o que é realmente importante: a união das famílias. Homens e mulheres que, nestes tempos de escuridão, expõem os melhores valores do ser humano: a solidariedade, o apoio, a ajuda genuína... Dão sem esperar nada em troca, sem fazer alarido, sem pedir recompensas.

A minha avó dizia sempre: “nunca olhes para trás, não fiques preso no passado, as recordações são boas para as noites de tempestade junto à lareira. Depois, guarda-as na memória; centra-te no presente, vive intensamente, esforça-te ao máximo, apoia-te na tua família e ninguém te irá parar...”

Nestes dias de crise, de incerteza, de escuridão, temos a ajuda que os avós nos oferecem altruistamente. Juntos conseguimos e junto seguiremos em frente, sem hesitações.

Com estas linhas, quis mostrar a minha profunda admiração por esta geração de avós,  de super-avós que dormem, cada noite, com a consciência tranquila e o doce sabor de saberem que enquanto tiverem um sopro de vida, não faltará o básico às suas famílias e continuarão a estar acima das hipotecas, dos despejos, dos cortes nos salários, das demissões, do desemprego... São FAMÍLIAS.

18/10/2015. 5:13 pm

Anonymous escreveu:

100% Excelente!!!!

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